Isaquiel Cori
Morador que sou do bairro situado nas imediações do Estádio Nacional 11 de Novembro, em Luanda, esta catedral do futebol inaugurada aquando do Campeonato Africano de Futebol 2010, vivo momentos de desilusão. O estádio era um oásis de luz no meio da escuridão profunda em que vivemos na Sapú 2. De bem longe, bem de longe, o morador quando se aproximasse do seu bairro, através da auto-estrada, depois de uma jornada de trabalho, guiava-se pela luz emitida pelo estádio e que subia para o céu.
No meio da escuridão em que vivemos na Sapú 2, o grande estádio e a sua luz eram vistos, com esperança, como símbolos do que não tínhamos e que ansiávamos ardentemente: a electricidade da rede pública e tudo o que ela propicia em matéria de comodidade, progresso e modernidade.
O estádio 11 de Novembro era o farol, o grande sinal de que, até pela proximidade, o século XXI estava às nossas portas, pois é inconcebível estar plenamente no século XXI sem desfrutar da luz eléctrica. E sem ter água ao domicílio.
É assim que vivemos na Sapú 2, um bairro construído de raiz pelo Estado, há cerca de cinco anos: sem luz e sem água ao domicílio. O estádio 11 de Novembro e a sua proximidade eram a nossa grande esperança, talvez “quem de direito” se lembrasse de que a moderna infra-estrutura não poderia coexistir com um bairro sem luz e água ao domicílio, pois, não já pela dignidade dos moradores, seria uma vergonha diante dos estrangeiros que fossem ver os jogos e passassem pelo bairro.
Agora, depois do CAN, a nossa esperança apagou-se! A luz que se propagava para o céu a partir do grande estádio, do estádio do século XXI, desapareceu. O estádio, ninguém sabe se contaminado pelo nosso bairro escuro, caiu na mais completa escuridão. E os acessos ao estádio que antes também eram caminhos de luz e iluminavam as nossas ânsias de entrar no século XXI, ficaram igualmente escuros. E nós, os da Sapú 2, perdemos o nosso farol! Perdemos o nosso oásis de luz e modernidade! Apagou-se a nossa esperança de finalmente desfrutarmos das “benesses” da cidadania do século XXI.
Da literatura à política, da música às artes plásticas, do sério ao cómico, do sagrado ao profano, do real ao ficcional, os nossos textos terão como substracto Angola, o país e as suas gentes. Queremos nos enriquecer com a experiência de quem divide connosco a existência neste Mundo de hoje, nesta época que nos coube viver. Simbolicamente, procuraremos estabelecer uma ponte com o passado e com aqueles que, não estando já vivos, deixaram um rasto de vida.
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