domingo, 24 de março de 2013

MULHERES: ESSAS DESCONHECIDAS...

Isaquiel Cori
 
 
Já em 1858, um eminente pensador, M. De Ponsan, no seu livro “História Filosófica e Médica da Mulher”, escrevia: a mulher “é um ser multiforme; autêntica Proteia, muda de aspecto sob os nossos olhos, segundo as paixões que nos animam: é o céu, é o inferno, é um anjo, um demónio, o dia, a noite, a paz, a guerra, o amor, o ódio, a beleza, a feieza, uma graça, uma fúria; é sempre ela, sempre a mesma, sempre una e sempre múltipla: una em relação a ela, múltipla em relação a nós, cujas paixões são várias. E como é feita para as nossas paixões, se a quisermos julgar sem paixão escapa-nos, nunca mais a encontramos”.

Trata-se evidentemente de um olhar e de um discurso masculino sobre a mulher.

Hoje, em pleno século XXI, a mulher continua a concitar a admiração dos homens, ao mesmo tempo que continua por eles incompreendida. Ela é um mistério nunca desvendado, uma fruta saborosa de que se desfruta mas que nunca é verdadeiramente possuída…

… Cá estamos nós, também, a incorrer nos estereótipos do discurso masculino sobre a mulher...

Décadas de luta e de conquista dos seus direitos cívicos, políticos, económicos e sociais, transformaram a mulher hoje num ser dotado de uma visão e de um discurso próprios.

Cantada na música e na poesia, exaltada nas artes, ela hoje não só canta-se e exalta-se a si própria, mas também estende o seu olhar em redor e dá corpo a uma visão própria do mundo, da vida, e até mesmo do homem, a partir de uma sensibilidade ‘diferente’.

De tal modo que alguns estudiosos da cultura chegam a falar numa música, numa poesia e numa arte, em geral, ‘feminina’.

A noção de ‘sexo fraco’ há muito deixou de fazer sentido, tal como a noção implícita de ‘sexo forte’: descobertas científicas atestam realmente a existência de algumas diferenças fisiológicas e ao nível do funcionamento do cérebro, entre homens e mulheres, mas nada que aponte para uma pretensa superioridade de um sexo sobre outro. No fundo essas diferenças resultam tão somente em sensibilidades e percepções específicas, que definem, afinal, o homem e a mulher.

Entretanto, a afirmação integral da mulher, em todo o mundo, ainda é uma meta por alcançar. Apesar de já existir uma numerosa élite de mulheres competentes, bem formadas técnica e academicamente, elas continuam essencialmente à margem dos centros de poder e de decisão.

Aqui não se trata já, tão somente, de uma questão de discriminação das mulheres, mas de uma questão mais global de défice dos direitos humanos, pois as mulheres constituem mais de 50 por cento da população mundial. E em se tratando de desenvolvimento humano, nas suas componentes política, económica, social e cultural, a marginalização das mulheres revela-se absurda e um factor de entrave para esse mesmo desenvolvimento.

À medida em que mais e mais contingentes de mulheres acederem a níveis de educação cada vez mais elevados e livrarem-se da pobreza, e à medida, também, em que mais e mais homens libertarem-se das amarras do preconceito, estamos certos, a igualdade de género, que será sempre uma meta e nunca um fim em si mesmo, uma igualdade baseada no justo reconhecimento do mérito e não obtida à força de discriminação, positiva ou negativa, será uma realidade.

 

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A força e o poder da fé erguem um novo templo

- Igreja Metodista Unida de António Rocha

Isaquiel Cori      Google+
 
A convite de Joca da Costa, presidente da junta administrativa, estive, num domingo recente, no culto da Igreja Metodista de António Rocha, no bairro Golfe 1. Foi a segunda vez que lá estive.
A primeira foi há cerca de dez anos e encontrei então uma igreja a funcionar numas instalações precárias de pau-a-pique. Algumas paredes pareciam ir cair a qualquer momento. Os crentes amontoavam-se num espaço pequeno com pouca circulação de ar e ao longo de todo o culto jamais largavam os lenços com que tentavam enxugar o calor do rosto.
A igreja de António Rocha serve uma comunidade que se estende do Golfe ao bairro Popular, maioritariamente de origem camponesa. Como em todas as igrejas angolanas, as mulheres são o motor da igreja, são elas que dinamizam as principais actividades. Ao longo da semana, pude informar-me então, elas iam às suas lavras nos arredores de Luanda, para regressarem à sexta-feira e então irem ao domingo assistir ao culto. Os seus filhos compunham a sociedade de jovens e davam as suas vozes ao grupo coral da igreja. Muitos desses jovens acabavam por namorar e casar com companheiros da igreja.
No domingo recente em que estive na Igreja de António Rocha constatei, diria incrédulo se não estivesse no interior da igreja, que a junta administrativa da igreja, agora composta em grande parte pelos filhos das mamãs camponesas, muitos dos quais  adquiriram a formação universitária, liderados pelo pastor Calenji, deitou abaixo o “edifício” de pau-a-pique e ergueu uma igreja digna desse nome, toda ela em cimento armado, com assentos no rés do chão e no primeiro andar. A arte decorativa no interior, ainda inacabado, em nada fica a dever aos lugares de culto situados em comunidades mais abastadas.
Há dez anos a igreja, em termos arquitectónicos, estava perfeitamente inserida no seu meio: a maioria das casas em redor era de pau-a-pique ou madeira, com quintais de chapas de zinco. Com o tempo as casas em redor passaram a ser de blocos de cimento, tal como os quintais: nesse cenário, a igreja de pau-a-pique parecia uma relíquia. Hoje, com o seu magnificente edifício, a Igreja de António Rocha sobressai no bairro, onde é o seu “farol” arquitectónico, a referência das referências.
Ao longo do culto pude aperceber-me que o mosaico  sociológico da comunidade de António Rocha é basicamente o mesmo de há dez anos, mas com uma franja mais alargada e activa de jovens conscientes do seu papel de baluartes da igreja. As mamãs e os papás camponeses estão cansados e muitos deles desiludidos com as desapropriações das suas lavras que deram lugar à construção de bairros residenciais, fábricas, o novo aeroporto e outros empreendimentos. Alguns dos papás e mamãs que eu há dez anos vira cheios de vigor e saúde a cantar e a dançar hoje ainda cantam e dançam mas estão visivelmente velhos, cansados e até mesmo doentes. Todavia, é visível nos seus olhos o brilho aceso pela fé  e o orgulho de terem participado da obra de construção do novo templo. E pelo facto de verem os filhos a erguer o testemunho da igreja.
Durante muito tempo reflecti sobre a força da fé e da igreja e do quanto as pessoas podem ser levadas a fazer boas obras em prol da comunidade, independentemente da sua condição social. A obra monumental da nova igreja de António Rocha foi feita com dinheiro arrecadado nos cultos. Tostão a tostão, kwanza a kwanza, as contribuições de cada um dos crentes e eventuais visitantes permitiram a concretização do sonho: uma igreja nova, moderna, digna dos crentes mas, sobretudo, do próprio Deus que eles adoram.
Ao sair daquele culto dominical renovei a minha fé em Deus e na capacidade que Ele tem de inspirar os homens a juntos fazerem coisas boas.