quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Aquela chuva em Kambambe...

Por culpa de vivermos em cidades apertadas, com a rede de saneamento básico a rebentar pelas costuras e as estradas esburacadas e quase intransitáveis, fomos imperceptivelmente metendo na cabeça que a chuva é algo que faz mal e quase a “diabolizamos”. Como se ela, uma realidade tão natural e antiga como a Terra, fosse a culpada da impreparação das nossas cidades.
O que seria então de Luanda se recebesse aquela carga de água que recentemente testemunhámos em Kambambe?
Localidade da província do Kwanza Norte, Kambambe, bem pertinho do rio Kwanza, alberga e dá o nome àquela que é a segunda maior barragem hidroélectrica do país, depois de Kapanda. Detentor de um potencial turístico inexplicavelmente inaproveitado ou insuficientemente explorado, Kambambe é um excelente lugar para repousar, meditar e reganhar forças espirituais e físicas para as mais diversas batalhas da vida. Da varanda da Pousada local tem-se uma vista do rio Kwanza que se dobra em cotovelo e das montanhas esverdeadas que lhe servem de moldura, tudo isso, de manhã cedo, enquadrado por um nevoeiro que se vai desfazendo ao correr do dia. O ar é húmido e puro e propicia a respiração profunda.
Pois então foi nesse ambiente calmo e saudável que ocorreu a grande chuva. Caiu sem fazer estragos, sem estrangular fosse o que fosse, completamente integrada no meio e na vida local. Foi uma farta, longa e bela chuva. Uma daquelas chuvas apropriadas para nelas nos banharmos e livrarmo-nos de todas as impurezas físicas e espirituais. Uma daquelas chuvas que nos obrigam a fazer um recorrido de memória e põem-nos ao mesmo tempo tristes e alegres, e fazem-nos pairar, com saudade, na impalpável fronteira entre o passado e o presente, fazendo confrontarmo-nos connosco mesmos. Aquela chuva em Kambambe foi um momento alto, fascinante e inquietante de êxtase e libertação. Aquela chuva em Kambambe...
Isaquiel Cori

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